( Sobre os Congressos Espíritas )
“Durante o período de elaboração, a direção do Espiritismo teve que ser individual. Deve, porém, tornar-se coletiva, entregue a um comité central, ou conselho superior permanente, composto de doze membros titulares, no máximo, e doze conselheiros. Conforme as necessidades, poderá ser secundado por membros auxiliares ativos.
“Compreende-se que, sem uma autoridade central (...) o Espiritismo correrá o risco de marchar à deriva. Não só essa direção é necessária, como também, importante, e, sobretudo, deve ser dotada de força e de estabilidade suficientes para enfrentar as tempestades.
“A autoridade do presidente do Comité é puramente administrativa: dirige as deliberações, superintende a execução dos trabalhos e a expedição dos negócios. Mas, fora das atribuições que lhe são conferidas pelos estatutos constitutivos, não pode tomar qualquer decisão sem o concurso do comité.
“O comité ou conselho superior será, pois, a cabeça, o verdadeiro chefe do Espiritismo, chefe coletivo, nada podendo fazer sem o assentimento da maioria e, em certos casos, sem o consentimento de um congresso ou assembléia geral.
“Devem ser também, periodicamente, realizados congressos, com a participação dos delegados das sociedades particulares, regularmente constituídas.
“Tanto na direção do comité como na do congresso, é a opinião da maioria que prevalece. No caso, porém, de o comité entrar no mau caminho, desviando-se dos pontos fundamentais da Doutrina, cabe aos congressos porem as coisas em ordem, no seu devido lugar.
“Portanto, o controle dos atos da administração do comité caberá aos congressos, que poderão decretar a censura ou uma acusação formal contra o comité central, por causa da infração do seu mandato, do desvio dos princípios reconhecidos, ou das medidas prejudiciais à doutrina.
“Os congressos serão, pois, um freio para deter a ação do comité ou chefe coletivo, que se desviar dos princípios doutrinários do Espiritismo.
(Fonte: “Projeto de Constituição do Espiritismo”, inserido na “Revista Espírita”, dezembro de 1868 – Ano XI, vol. 12).
NOSSO COMENTÁRIO
Como se percebe, claramente, Allan Kardec era 100 % democrata. Jamais desejou que o movimento espírita estivesse nas mãos de um só indivíduo, que concentrasse em sua pessoa todos os poderes do grupo. Na hora das decisões, era preciso que todos primeiramente se manifestassem, pró ou contra, cabendo, no final, à maioria, determinar o que se deverá fazer a partir de então. Nada de autocracia ou cesarismo; nada de plutocracia.
Foi, tomando por base esse “Projeto de Constituição do Espiritismo”, que os “pioneiros do Espiritismo no Brasil” criaram a FEB - Federação Espírita Brasileira, em janeiro de 1884, que passou a ser a nossa comissão central (comité). Mas, na verdade, desde o seu nascimento, a FEB nunca foi uma instituição democrática e sim autocrática, porque o grupo dos roustainguistas assumiu o controle do Conselho Superior, encarregado de eleger, periodicamente o presidente da instituição e este só pode ser um roustainguista declarado. Nenhum que se diga só kardecista, até hoje pôde jamais ascender à presidência da auto-intitulada “Casa Mater do Espiritismo no Brasil”. Os roustainguistas tomaram o poder e não abrem mão dele. Mas eles, inteligentemente, também se declaram kardecistas. E assim conseguem o domínio da situação e a direção do movimento espírita, contando com o apoio dos que se declaram só kardecistas, mas que, por uma questão de interesse pessoal, ou para não desagradarem os amigos que têm na direção da FEB, ou ainda, para não entrarem em confronto direto com essa poderosa instituição, submetem-se, passivamente, a tudo; mantêm-se, humildemente omissos, em cima do muro, indiferentes. E assim a entidade máxima do movimento espírita brasileiro, segue em frente, servindo, ao mesmo tempo, a dois senhores, que se expressam de forma diferente: Kardec e Roustaing.
E, perguntamos nós, os congressos, realizados até agora, no Brasil, são mesmo um “freio”, usado para deter o mal, para coibir o erro, para fazer mudanças necessárias? Estão, realmente, atingindo essa finalidade? Não! Claro que não! Porque, quando convocados, só servem para congraçamento, confraternização; para reencontro de confrades amigos; para serem vistos de perto os líderes de sua preferência; para troca de elogios e de experiências; para oradores, eloqüentes e cultos, desfilarem pelas tribunas dos Centros de Convenções, esnobando para aparecerem na mídia e impressionarem a massa ignorante das obras da Codificação, despejando seus conhecimentos doutrinários e mostrando, como verdadeiros atores, seus dotes oratórios, aperfeiçoados em cursos especializados. Agora, discutir temas polêmicos! Nem pensar!...
E assim o movimento espírita brasileiro vai andando, de mal a pior! Completamente dividido!...